Para muitos de nós, pesca esportiva é, além de uma atividade prazerosa, um exercício de relaxamento e interação com a natureza. Há quem diga, porém, que pescar e soltar o peixe não tem a menor graça. Digo-lhes que mais vale praticar um ato de consciência que um ato impulsivo para satisfazer o ego. Há ainda quem pense que pescaria é só para farrear; a esse pessoal, digo que quando encontrarem uma atividade que realmente lhes complete, aí então entenderão o significado de tudo. E aos que se rendem ao comodismo e pensam que tudo é complicado, que há dificuldades em aprender e que suas limitações não lhes permitem praticar uma atividade física, a esses convido conhecerem Estevão Dalonso.
Residente em Joinville e tendo a companhia constante de uma cadeira de rodas desde os 22 anos, Estevão (hoje com 37 anos) vive no dia a dia a dura realidade imposta pela má acessibilidade de nossas ruas, transportes e estabelecimentos em geral. O panorama infelizmente não é melhor quando ele sai da cidade para praticar sua atividade-paixão, a pesca esportiva.
A falta de infraestrutura é generalizada: não se veem pesqueiros, hotéis, pousadas e barcos-hotel preparados para o atendimento a cadeirantes. Calçamento adequado para percorrer um lago, rampas com inclinação correta e banheiros adaptados já seriam bons pontos para começar. Porém, o que há são buracos, escadas e barrancos, verdadeiros abismos para uma pessoa que tem mobilidade reduzida.
Como não depender da boa vontade de governantes e empreendedores significa esperar demais, a solução para pescar é adaptar a logística e contar com a ajuda de um “guia” que ajude a proporcionar uma pescaria confortável e segura. Amante e praticante assíduo do fly, Estevão usa a propriedade da família para seus treinamentos, já que em sua região há poucos locais que lhe permitem realizar seus arremessos e acessar rios e lagoas.
Professores da modalidade como os amigos Betinho Oliveira, Gerson Kavamoto, Kid Ocelos e Rubinho de Almeida Prado já mostraram em diversas oportunidades – seja em revistas, TV ou feiras de pesca – que o molejo de tronco é fundamental na modalidade. Apesar de ficar evidente que a paralisia atrapalhará bastante alguém em sua condição, ao ver Estevão praticar seus arremessos entendemos como a força da superação torna tudo possível.
Sem luta, não
Após ficar paraplégico em 1999 em consequência de um acidente ocorrido no retorno de uma pescaria no Mato Grosso, Estevão fez parte de uma série de projetos de inclusão e adaptação para pessoas com deficiência, além de ter participado nos Jogos Pan-Americanos de 2007 como colaborador e até hoje ministrar palestras sobre o tema em escolas e empresas.
Durante algum tempo, como ele diz, a sensação era de ter perdido seu próprio eu. Porém, Dalonso lutou contra as novas barreiras descobertas, do preconceito às condições precárias de acessibilidade nos lugares comuns às outras pessoas. “Vi que tinha de buscar forças e, mesmo com algumas derrotas, continuei almejando a vitória. Descobri que essa luta não era só minha, mas de outros que enfrentavam problemas iguais aos meus, mas que, talvez por comodidade, desistiram de lutar”, diz, referindo-se a pessoas em situação semelhante que se entregam à deficiência e parecem parar no tempo.
O objetivo de Estevão é mostrar para as pessoas com deficiência que é possível exercer uma atividade, seja ela qual for. A pesca é seu exemplo pessoal de uma alternativa que reúne atividade física e mental que, em contato íntimo com a natureza, tem um poderoso poder terapêutico e transformador. Ao invés de “ficar sentado” esperando, seu conselho é simples e objetivo: monte seu equipamento, adapte-se, aprenda, peça ajuda se necessário. Mas não fique parado. E pratique pesca esportiva!
Mais sobre Estevão Dalonso em
www.facebook.com/estevao.dalonso
Por Wellerson Santana – Matéria publicada na edição 192 da Revista Pesca Esportiva