O Ministério Público Federal (MPF) no Amazonas apresentou manifestação à Justiça, contra a União e o Ibama, pedindo a manutenção da sentença que proíbe a pesca comercial, ornamental e esportiva no rio Jauaperi, na região entre o paranã do Maçueira e o posto de fiscalização da Terra Indígena Waimiri Atroari, na fronteira entre os estados do Amazonas e de Roraima. Impactos negativos decorrentes dessas modalidades de pesca, com exceção da de subsistência, podem interferir na sustentabilidade do acesso aos recursos pesqueiros e a manutenção das condições de vida dos habitantes da região.
Na manifestação, o MPF ressalta o risco de dano irreversível ou de difícil reparação ao meio ambiente, haja vista que muito raramente este poderá retornar, de forma completa, ao estado inicial dos recursos pesqueiros, após ser degradado. O rio Jauaperi é a principal fonte de subsistência de dezenas de comunidades ribeirinhas e do povo Waimiri Atroari e não há, atualmente, ações específicas adotadas pelo Comitê Permanente de Gestão da Bacia Amazônica no sentido de regulamentar a pesca na área.
Além da proibição da pesca irregular, na ação movida pelo MPF, é pedido ainda a responsabilização da União e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) quanto a colocação de placas de identificação no rio, com informação direta aos pescadores profissionais cadastrados e suas respectivas associações e cooperativas; a realização de fiscalização contínua na região afetada pela pesca irregular; e a realização de pesquisa científica, com prazo de 12 meses para conclusão, dos estoques pesqueiros no rio Jauaperi.
A União e o Ibama apresentaram recursos contra a sentença, que segue processo em tramitação na 1ª Vara Federal do Amazonas, sob o número 2009.32.00.003350-1.
Histórico do caso
O objeto da ação foi inicialmente ajuizado pelo Centro de Estudos em Direito Ambiental (Cedam), no qual narra que, nos anos de 2004 e 2005, houve escassez de peixes na região do rio Jauaperi. Grupos comunitários que vivem na região denunciaram, a época, diversos episódios que envolvem ameaças sofridas por barcos “geleiros”, caçadores e tartarugueiros. Nos depoimentos, mencionaram o período pelo qual suas famílias passaram fome, porque não conseguiam pescar o necessário para sua subsistência.
A partir do acontecimento desse fenômeno, os comunitários elaboraram um acordo de pesca para garantir a sustentabilidade dos habitantes da região, tendo sido regulamentado, à época, por instrução normativa pelo Ibama. Após o fim da validade do acordo, em 2009, não houve nenhum interesse do Ibama em realizar novas tratativas para garantir a continuidade do mesmo, o que motivou o Cedam a buscar a Justiça.
A sentença ressalta as inúmeras tentativas do MPF – que assumiu a autoria da ação posteriormente – de celebrar um Termo de Ajustamento de Conduta Ambiental para buscar uma solução consensual para o impasse, mas entraves de ordem burocrática por parte do Ministério da Pesca impediram o avanço das negociações.
Estudos nunca realizados
Sem acordo, a Justiça decidiu proibir a pesca comercial, ornamental e esportiva em toda a extensão do rio Jauaperi e determinou, entre outras medidas, a realização de estudos de verificação da necessidade de manter a proibição e pesquisas científicas dos estoques pesqueiros, o que nunca ocorreu. “Estou convencida de que os requeridos não apresentaram resposta científica válida a garantir que a liberação das diversas modalidades de pesca na região não trará prejuízos ao ecossistema, ao bioma Amazônia e à preservação das comunidades tradicionais e indígenas que de lá subsistem”, sustenta trecho da sentença, proferida pela juíza federal Jaiza Fraxe, em agosto de 2017.
No recurso apresentado em março deste ano, o MPF reforça a ausência de realização dos estudos passados tantos anos após a determinação judicial e acrescenta ainda que a fiscalização na região tem sido insuficiente, conforme demonstrado em diversas ocasiões no processo, inclusive com pedido de aplicação de multa pelo Ibama.